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Desde o dia em que alguém teve essa idéia
De fazer clubes para gente idosa,
Muito velho desfruta e agora goza
Nos teatros servindo de platéia,
Tendo outros, até, já feito a estréia,
Como um artista da melhor idade.
Hoje pode voltar à sociedade,
Integrado, porque é cheio de vida,
E a velhice que já estava perdida
Tem agora, outra vez, jovialidade.

Nesses grupos e também nos programas
De teatro, de baile e toda festa,
Cada um vai vivendo o que lhe resta,
Esquecendo das dores e dos dramas;
Muitos deles saíram até das camas,
Onde estavam em desânimo total,
Para agora ir brincar no carnaval
E vestir inclusive fantasia,
Indo às ruas, bem cheios de alegria,
Um desejo que é de qualquer mortal. 

Parabéns aos que ficam no comando
Desses grupos, que dão felicidade
A esses velhos que têm bastante idade;
Muitos deles, já quase se arrastando,
Nunca podem sozinhos, se orientando,
Escolher o lazer que lhes agrada.
Mas com a ajuda, até de madrugada,
Se divertem e gozam de respeito;
Têm agora o lazer que é um direito,
Dos vovôs de cabeça esbranquiçada!

Ah se eu soubesse peneirar a chuva,
Como fazem os anjos do Senhor…
Ah se eu pudesse aquecer o sol,
Com o calor de Deus, o Criador…
Ah se eu pudesse pôr na estrela a luz,
Igual àquela que anunciou Jesus!
Ah se eu pudesse colorir a lua,
De branco prata ou de um azul celeste…
Ah se pudesse pôr fertilidade
E fazer belo todo o pobre agreste…

Então seria eu o mais radiante
De todos os viventes desta Terra…
A noite eu a faria clareada,
Iluminando todo o pé da serra…
Os homens, os faria sempre alados
Para voarem pelo espaço e ao lado
Colocaria muitas andorinhas
Pra que cantassem melodias de amor
Nas noites de estrelato e de magia,
Com grandes reverências ao Senhor…

Porém, se sei sonhar posso fazer;
Sem ter o tal poder do Redentor,
Eu posso construir, de pouco e pouco,
Um mundo de harmonia e muito amor.
Por que ter pretensões de ser divino
Se, espiritualmente, eu sou menino
E tenho pela frente a eternidade?
Posso aprender e depois ter o mundo
Que sonho e é impossível construir
Numa simples magia de um segundo!…

30/08/2007

 

Um momento novo da beleza crepuscular.

A vermelhidão anunciava que o sol se despedia. Cumprira sua tarefa junto ao povo do ocidente e deslocava-se para o lado inverso do planeta, onde novo dia começava a raiar.

Nasce um novo luto porque a noite é sem lua.

Uma luz pisca, pisca, no horizonte. Um barco, talvez. Um pescador que se serve do silêncio para usar a natureza na continuidade da vida. Ou, quem sabe, namorados que se isolaram na solidão do mar, para escutar estrelas e o bramir das ondas que entoam melodia para os que têm ouvidos afinados e sintonizados com Deus.

É a voz da natureza que nos fala intermitente, mas que nunca ouvimos devido à clausura nas coisas miúdas. É a melodia do amor. Do amor intenso, que ama tudo e todos, incondicionalmente.

Para mim, apenas mais um dia. Cheio dos vazios da tristeza e das incertezas do amanhã. Dia pelo qual apenas transitei. Nada deixei, nada levei; nada ensinei, nada aprendi. Passou fugaz.

Quantos dias como este já vivi! Vazios de utilidade, de amor e de certeza.

Por que meus dias são assim ?

Enquanto hiberno, o sol trabalha. Está agora do outro lado, vivo e altivo como há pouco estava aqui. Não pára, não descansa, porque nunca está cansado. Traz-nos a vida que todos precisamos. Oferece saúde e luz às almas.

Confiro no calendário dos homens e vejo o tempo perdido. Dias, meses, anos, décadas. No entanto, bastaria um só segundo de vontade para reverter o desânimo e compreender o sol. Num átimo, poderia ser um homem novo e fazer com que parasse o tempo para sentir felicidade. Viver na intensidade do segundo e abandonar a apatia que domina o tempo inteiro. Se quiser, eu posso. Mas não sei. Preciso de alguém que me ajude e explique porque insisto em permanecer enterrado no chão, quando devo viver nos ares, nos céus, nas nuvens.

Busco uma receita que me alente e faça com que eu compreenda a simplicidade deste minuto espiritual que uso na Terra. Que eu me despoje de cargas pesadas e fúteis, descartáveis no momento da sublimação. São pesos de chumbo que me mantêm afundado e me impedem de voar. Meus melindres, minha ganância e minha inconformação. A vida não é isto, mas que posso fazer se ainda não aprendi a viver.

Meus pais me ensinaram: – Seja bom, ajude as pessoas, seja honesto. Não só com o dinheiro, mas seja verdadeiro nas atitudes. Crescia e já nos primeiros anos eu percebia como era difícil viver como me ensinaram. Mas eu tinha de esforçar-me e ser bom filho. Ganharia o céu!

Disputando as primeiras namoradas ficou claro o que me esperava. A decência tinha de competir com a hipocrisia. Mas eu não desistiria.

Cresci, formei-me e saí em busca de trabalho. Sem amigos ou políticos que me recomendassem fui pelo caminho normal. E começaram as desilusões…

Sem experiência não podemos contratá-lo. Desculpe. – Só pagamos salário mínimo, porque você nunca trabalhou. – No escritório não temos, se quiser como operário… – Sei que tem diploma, mas outros também têm. – O emprego que temos não é para o seu nível. Lia jornais, falava com pessoas, procurava agências e nada! Qualquer coisa servia para começar, mas não havia nada.

Certa tarde, cansado, lembro-me que sentei na soleira de uma porta, pensando nas injustiças do mundo, com fome e perdido na multidão.

Um “carinha” me olha e pergunta: – E ai, meu, tudo certo?

Estranhei, mas que mal havia em falar com ele! – Legal não tá. Tô procurando serviço e não acho. Faz quatro meses.

É, emprego não tá fácil. Se quiser, posso arranjar um quebra galho, até “pintar” algo melhor. É coisa “manera”, mas dá pra faturar uma “graninha”. Será que chegou o meu dia, pensei. – Tem trabalho pra mim, perguntei-lhe?

– Pode ser. Eu trabalho para uns “caras” que vendem um pó pra curar dor de cotovelo, briga de família, traição… É remédio barato ! A gente compra e revende. O lucro não é grande, mas dá pro arroz e feijão…

– Remédio! Mas quem vende remédio é farmácia…

– Esse não, meu. Esse tem de ser tête-à-tête e em dinheiro vivo.. Toma lá, dá cá. Da fábrica ao consumidor, manjou? E aí? É pegar ou largar.

Tantas lutas pelo céu e agora à beira do inferno. Vou arriscar. Saio logo dessa.

– Falô, cara. Dá a dica. Qual é o barato?

– É assim que se fala, irmão. Vamos nessa!

Semana passada completei vinte e oito anos. Não fiz carreira como vendedor, mas virei consumidor do tal remédio que cura tudo. E como nunca tenho dinheiro, pra consegui-lo já roubei, matei e sei que logo parto desta pra melhor. Fazer o que? Eu bem que tentei ser honesto, mas não deu.

Nos poucos minutos que a minha cabeça ainda me permite pensar, eu analiso e vejo como é difícil alguém ganhar o céu. O ser humano aqui da Terra não leva a sério essas coisas de amor ao próximo. Talvez em algum planeta haja quem se preocupe com os outros.

Sou escravo do maldito pó. Sonhei ser homem e hoje sou apenas uma droga.

Menção honrosa da Academia Literária Gaúcha no 3º Concurso Nacional de Crônicas e Poemas – 24/9/99

 

Ela, dezessete anos. Bonita, cheia de sonhos a povoar-lhe a mente. O príncipe encantado a atendia nos mais minuciosos anseios.

Filha única, família importante, vivia em conceituada cidade do interior de Minas Gerais. Sua mãe respeitável senhora e o pai um político influente. Eram figuras obrigatórias nas sociedades e nos eventos locais.

Apenas estudava, pois queria ter uma formação cultural para nivelar-se ao noivo, cobiçado jovem da cidade, que acabara de formar-se em medicina. Era competente obstetra que além de trabalhar no hospital da cidade tinha bem montado consultório presenteado pelos pais.

Programavam casar-se em seis meses. A casa já estava decorada e a lua de mel, depois de uma festa como a cidade jamais vira, seria em Veneza. Com direito a passeio pelos canais, ouvindo os gondoleiros com suas cançonetas.

Acabara de voltar da faculdade e passeava pelo florido parque da cidade. Um local aprazível e pacato. Era dia de semana e havia pouca gente em passeio. Mas ali não havia violência, assalto.

No entanto, como se fora trama do destino, que às vezes tenta entravar-nos a felicidade e altera o que era impossível de dar errado, ágil como um gato um louco salta à sua frente, tapa-lhe a boca e a conduz a um lugar ermo. Asfixiada, desmaia e o maníaco se aproveita para destruir o tesouro que guardava para o seu eleito: sua honra de donzela, que ali desaparecia sem que ninguém explicasse o por quê.

A família, preocupada, porque a noite chegara, sai a sua procura. Tiveram de recorrer à polícia, que rapidamente a encontrou. De roupas sujas, com dores e desconforto, imaginava que tivera um mal estar e desmaiara.

Mais calma, consegue recordar-se da cena. Fora atacada. De nada mais se lembrava.

Levada aos médicos, realmente havia sido estuprada e restava saber se do ato viria um filho e também alguma doença.

Passado o tempo necessário, exames e, felizmente, nenhuma contaminação, mas a gravidez fora confirmada.

A revolta dos pais é a convencional. Por que na nossa casa? Por que com nossa filha? Diante disso, aconselham o aborto para limpar-se da sujeira que seu ventre carregava, resultante de um ato agressivo e sórdido.

Consultada, a jovem é incisiva: – Não admito, sequer, discutir o assunto. Meu filho vai nascer.

A jovem sentia uma alegria interior que a unia intensamente àquele ser que começava a ter vida em suas entranhas. Uma luz se acendera dentro dela, fazendo esquecer o momento de dor que parecia trazer-lhe desgraça e infelicidade.

Nessa hora, suas convicções espíritas que jamais havia revelado aos pais católicos, davam-lhe a certeza de que não herdamos dos ancestrais a moral e o sentimento. Eles só fornecem um novo corpo para que a alma que já existe possa viver novamente.

Repetiu, enfaticamente: -Meu filho viverá.

O noivo não podia aceitar a decisão. Concordaria em desposá-la apesar de tudo, mas não criaria o filho de um maníaco, que, certamente, teria os mesmos instintos perversos do pai.

Ela, irredutível, esperou o filho nascer.

O doutor, totalmente desinteressado pelo destino da jovem, nem lhe ofereceu seus préstimos profissionais. O destino os separou totalmente.

A moça, sem abalar-se, tinha absoluta convicção do que fazia e queria. Chega ao hospital onde em pouco tempo vem ao mundo um bonito e saudável menino. Perfeito, fisicamente.

Ela, com muito leite, o amamenta com prazer. Ele, ao sugar-lhe o peito, extrai o alimento com lhaneza. Parece que não quer feri-la; nunca. Se o nenen é pequeno, o espírito que o anima já se demonstra um gigante de sentimentos e já o mostra no simples ato de mamar.

Passam-se os anos e o menino se desenvolve. É motivo de alegria para a mãe, que o amou desde o primeiro segundo que o sentiu em seu ventre. Inseparáveis, completam-se.

Na escola, goza da simpatia de todos e, apesar de não ter pai, o que realça numa cidade de interior, ninguém o discrimina. É bom colega, as meninas já o paqueram e os professores o respeitam pelo interesse e responsabilidade que dedica aos estudos. A mãe já o havia deixado a par do acontecimento e o fato de ter nascido de um estupro não o incomodava. Amava ainda mais a mãe por ter lutado pelo seu nascimento.

Estuda línguas, pratica natação. Tem corpo de atleta.

Os avós aprenderam a amá-lo e esqueceram os traumas que envolveram o seu nascimento. Acreditam, mesmo, que a determinação da filha valeu a pena.

Chegam férias e os dois saem em merecida viagem de recreio. Mãe e filho, felizes, botam o pé na estrada…

Oito horas de uma manhã ensolarada. De repente, um carro que ia à frente deles despenca do alto da ponte para dentro do rio.

O moço não pensa duas vezes. Estanca o veículo e, ágil, joga-se nas águas, mergulha fundo e retira um homem que tivera um mal súbito.

Levam-no ao hospital, enquanto a mãe, emocionada, admira a coragem do seu “menino”. Bem atendido, o homem fica fora de perigo.

Informado do acontecimento, demonstra desejos de conhecer e compensar o jovem pelo seu gesto corajoso. Pede que o convidem a vir visitá-lo, pois seus dados foram anotados na portaria.

Amável e simpático, como de hábito, atende ao chamado e volta ao hospital para conversar com aquele estranho. Vai em companhia da mãe que se mantivera em silêncio durante todo o episódio.

Quando o paciente viu a mulher, levou um susto e perguntou-lhe:

-Que faz você aqui?

-Vim acompanhar o meu filho, que atendeu ao seu convite.

-Seu filho!?

-Sim, meu filho. Aquele menino que você não quis aceitar e a quem, agora, deve a sua vida.

Num longo e emocionado silêncio, todos se abraçaram, sem que o jovem compreendesse o que estava acontecendo, porque esta parte da vida de sua mãe lhe era ainda desconhecida.


Ele, quarentão, tipo esguio, musculoso, olhos claros, daqueles que as moças não deixam em paz.

Ela, quinze anos, corpo de mulher, cabelos cuidados, pernas grossas e roliças, dentes alvos, olhos penetrantes, sorriso maroto.

Olharam-se e ele não deu muita importância. Era jovem demais para ele. Mas ela apaixonou-se. Teria de conquistá-lo.

Não foi difícil com seu jeito dengoso, angelical, envolvente. Em pouco tempo, casaram-se.

Dez anos e tudo corria bem. Mas ele chegou nos cinqüenta e ela nos vinte e cinco. Em plena fogosidade. O amor havia esfriado. Ter outro, porém, nem pensar.

Dadinha se controlava, embora olhasse para os da sua idade e tivesse sonhos eróticos. Zé Bento me mata se souber que eu ao menos penso noutro homem. Não tem jeito. Entrei nessa, pensava, vou ter de ir até o fim.

Quando saiam à rua, ele tinha quatro olhos para vigiá-la. Ai de quem a olhasse porque ele dava uns sopapos bem depressa. E todos conheciam seu gênio. Falava e fazia.

Dadinha tem uma idéia. Não dizem que mordida de cobra cura com veneno de cobra? Era isso.

Começou a sair para as compras e na volta reclamava do Toninho. Lançava um pouco de veneno. Inventava, mas…

– Que foi que ele disse?

– Não sei direito, porque não escutei bem. Mas coisa boa não foi.

Eu mato aquele cara!

– Calma, Zé, não fica nervoso. E lhe fazia um carinho.

Passados dois dias, lá vinha Dadinha.

– Zé. Toninho me falou umas graças. E me olhou com uns olhos de desejo. Até trancou a boca e me olhou chiando.

– Ah, mas eu pego aquele cabra. Que é que ele está pensando. Mexer com mulher casada…

E assim caminhava o tempo.

Certo dia, Zé Bento encontra Toninho e vai tomar satisfação.

– Você anda mexendo com a minha mulher, não é, seu safado. Melhor parar porque eu quebro a sua cara.

– Quebra nada, Zé. De mais, não estou mexendo com ninguém. Eu já tenho mulher e sei respeitar a mulher dos outros.

– Veja lá, eu te mato, hein.

E Dadinha continuava a pôr veneno no coração de Zé Bento.

Um dia, Zé estava nervoso, cheio de problema de trabalho, falta de dinheiro. Quando Dadinha contou que Toninho tinha falado umas graças para ela, ele saiu e encontrou o rival.

– Fala agora, moleque, o que você fala pra minha mulher.

Antes que Toninho abrisse a boca, meteu-lhe um tiro na testa e derrubou-o no meio da rua, para espanto de todos.

Preso em flagrante, Zé Bento foi julgado e condenado por homicídio premeditado. Culposo.

Dadinha chorou muito e repetia para o Zé.

– Zé, por que você fez isso? Eu não vou agüentar viver sem você.

Nos primeiros meses, ia visitá-lo todos os dias. Depois uma vez por semana, uma vez por mês. Enquanto isso, ela tinha todos os homens bonitos e jovens com os quais realizava suas fantasias e seus romances.

Um dia, bate à porta um mensageiro.

– A senhora é Da. Dadinha?

 – Sim, eu mesma.

– Esposa do Zé Bento, preso lá na Gamela ?

– Isso mesmo.

– Tenho uma notícia triste pra senhora. Seu marido foi encontrado morto na cela. Enforcou-se com um lençol.

Dadinha finalmente estava viúva. Mas, ao invés de ficar contente, Dadinha naquele dia chorou copiosa e convulsivamente.

A imagem acima é um risco para pintura em óleo sobre tela, de Leonardo da Vinci.
Boletim Informativo "Tribuna Literária"
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